sábado, 21 de abril de 2012



Em Memória Deles

Há alguns episódios em nossa vida que nos ficam marcados profundamente e eternamente. E nós não podemos escolher que tipo de fato ficará em nossa memória, se serão os fatos bons, engraçados ou os ruins, tristes. O fato que contarei a seguir é algo que me marcou muito, mas eu não sei se é bom relembrá-lo ou não, pois... não sei como falar... ao relembrá-lo lembro coisas tão boas mas o fato, em si, não é bom.
13 de agosto de 2010. Um dia aparentemente normal. Porém nublado, com momentos de chuva(eu odeio dias chuvosos). Como todas as manhãs, levantei-me e fui para a escola, minha mãe foi trabalhar e o meu pai e meu irmão ficaram em casa. Mas eu não imaginava o que aconteceria naquele dia, naquela sexta-feira. Na escola foi tudo “normal”, com temas, trabalhos e provas, sem nada diferente ter ocorrido... ainda.
Voltando para casa, quando eu desci do ônibus, meus cachorros foram me receber, como sempre, tão alegres, que pulavam, e queriam brincar. Chegando em casa, eu preparei a comida e eu e meu irmão almoçamos, normalmente. Depois, eu o levaria para a escola e voltaria para casa, para fazer os temas, fazer uma faxina e por último, brincar com os meus queridos amigos, Bob e Guri, alguns de meus cachorros.
Ao terminarmos de almoçar, eu e meu irmão saímos, e não vimos nem o Bob, nem o Guri e nem os outros cães, incluindo a mãe dos dois pequenos. A história de como o Bob e o Guri apareceram em minha vida daria outra crônica, porém mais engraçada. Mas vou tentar resumi-la: num dia quente de verão, sim, lembro-me, 28 de janeiro desse mesmo ano, eu estava na lavoura de meu pai e vi um cachorro, ou o que pelo menos eu achava que era um cachorro, mas me surpreendi ao perceber que não era um cachorro, e sim uma cadela, muito dócil e que me seguiu a manhã inteira. Quando meu pai à viu disse-me que ela estava prestes a dar a luz a filhotes. Mesmo não querendo mais cães por já termos muitos, nossa família resolveu ficar com ela, pois alguém já tinha sido muito mau com ela, jogar uma cadela fora, apenas por ela estar prenha? Somente o ser humano para fazer uma brutalidade dessas! E nós, não faríamos o mesmo. Não muito tempo depois, no dia 11 de fevereiro de 2010, a nossa cadela dá a luz à cinco cachorrinhos e uma cadelinha, muito fofinhos. Ficamos desconfiados de que os cachorrinhos fossem filhos de um outro cachorro nosso, mas não sabemos se é verdade. Dos seis, ficamos apenas com dois, os outros foram doados. Nós ficamos com um que era idêntico à mãe, o Bob, e o outro idêntico ao pai (se o nosso cachorro fosse o pai), o Guri.
Caminhando em direção à escola de meu irmão, não sei por qual motivo, eu olhei para trás e vi o Bob entrando no nosso quintal, que fica junto a casa e disse para o meu irmão:
- Olha, Júnior, o Bob chegou!
Sempre que eu levava meu irmão para a escola, eu aguardava até a professora chegar, por uma questão de segurança, não somente do meu irmão, mas como de todos os alunos. Mas naquela sexta-feira a professora estava demorando muito, só podia ter acontecido alguma coisa. Interrompendo esse meu pensamento, uma vizinha chegou e me disse que a professora havia lhe ligado e dito que o pneu da sua moto furou e que perguntou se eu poderia ficar com os alunos enquanto ela não chegava. Eu tinha muitas tarefas para fazer em casa, mas sendo eu uma ex-aluna daquela escola, resolvi fazer esse favor. Fizemos brincadeiras, assistimos TV, desenhamos no quadro, e outras coisas. Até que a professora chegou. Ela me agradeceu e eu fui para casa.
Chegando em casa, já sendo umas 3 horas da tarde, não vi nenhum cachorro em casa, não estranhei, pois às vezes, eles saiam para dar um ‘passeio’ ou estavam em minha avó. Meu pai estava se aprontando para ir à cidade, fazer os negócios semanais, e aproveitar e buscar a minha mãe no seu trabalho. Logo depois que ele saiu, eu comecei a fazer aquela faxina em casa. Uns cinco minutos depois, meu pai voltou, angustiado:
- Patrícia, você viu o Guri e o Bob hoje?
Eu já assustada, respondi:
- Eu vi o Bob ao meio-dia. Mas o Guri eu não vi.
- Você não viu se alguém veio aqui hoje à tarde?
- Não, por que?
- O Guri está morto na porteira, próxima da estrada.
Morto? Eu não podia acreditar. Comecei a chorar, chorar muito. Como estou fazendo agora, ao relembrar essa história.
Meu pai logo me disse para procurar o Bob e amarrá-lo, pois ele achava que o Guri havia morrido envenenado e com certeza ainda havia vestígios do veneno próximo do local onde meu pai encontrou o cão. Mas já era tarde demais, o Bob não estava mais em casa, logo pensamos no pior: ele já havia comido o veneno também. Os cachorros grandes já sabem reconhecer o veneno, mesmo que este seja dado aos cachorros junto com alimento, como feito com o meu Guri, mas os pequenos como o Bob e o Guri, coitadinhos, tão pequeninos, não souberam reconhecer.
Meu pai não iria deixar o Guri lá, próximo da estrada. Ele iria trazê-lo e enterrá-lo, pelo menos isso. Ao trazer o Guri, meu pai o pôs num canto isolado, uma espécie de uma gaiola. Disse-me que era melhor não chegar perto ou tocar nele, pois o veneno ainda poderia agir contra mim. Meu pai ainda tinha que ir para a cidade, então foi.
Eu larguei tudo e, com uma corda nas mãos, fui em busca do Bob, e mesmo sabendo que eu não o acharia ou que o acharia morto, eu dizia para mim mesma que eu o encontraria, vivo. Caminhei muito, apesar do chuvisqueiro que molhava o meu rosto, não parei, um instante de procurá-lo. Fui até as lavouras, onde encontrei minha avó, que não sabia de nada ainda e que, ao lhe contar, ficou perplexa e disse que não havia visto o Bob desde o meio-dia.
Sempre desabando-me em lágrimas, lágrimas que apenas eu podia ouvir e sentir, continuei procurando, fui na casa de meus avôs e nada. Como ao redor de minha casa há bastante matagal, seria bem complicado encontrar o Bob, ainda mais se ele estivesse morto. Fiquei procurando o Bob a tarde toda, e não encontrei nada.
Ao voltar para casa, decepcionada e muito triste, não resisti e fui ver o Guri, ele estava com a boca cheia de espuma, consequência do veneno ingerido, voltei a chorar novamente ao vê-lo.
Quando o meu irmão chegou da escola, tratei de não contar nada para ele, apenas dizer que o Bob e o Guri haviam saído e ainda não tinham voltado, como já havia acontecido com outros cachorros nossos. Ele acreditou, e não abalou-se muito, não tanto quanto eu (e eu sou mais velha que ele!). Quando o meu pai e a minha mãe chegaram, eu contei tudo para a minha mãe, a única que ainda não sabia de nada. A cada hora que passava, eu ficava mais angustiada, pois o Bob não aparecia.
À noite, fiquei sabendo de outra tragédia ocorrida naquela sexta-feira: a gatinha da minha avó, bem pequenina também, havia morrido, e envenenada. Naquela noite, quase não dormi, pensando no dia seguinte e no Bob. A dor da perda desses dois, começou a diminuir, conforme passavam-se os dias, mas o corpo de Bob não foi encontrado.
Alguns dias depois, fazendo uma faxina no galpão e embaixo dele também, à procura de uns canos para o nosso forno de fumo, meu pai encontrou uma coisa estranha, que ele não sabia descrever bem, pois estava longe dele, ao se aproximar do estranho, ele leva um grande susto: era o Bob, ele havia conseguido chegar em casa, mas o Guri não. O Bob morreu em casa, embaixo do galpão, um lugar que eu havia olhado quando procurei-o, naquela tarde. Naquele momento, senti-me culpada.
Uma semana depois do dia 13, no domingo, um outro cachorro que eu gosto muito foi envenenado, mas desta vez, nós conseguimos salvá-lo, pois meu pai ligou para um veterinário e ele trouxe injeções e remédios. E nós vimos quando ele chegou, babando e com as pernas trêmulas. Ver isso acelerou o processo para salvá-lo. O Lulu, o cachorro desta vez envenenado, ficou muito mal e quase morreu, mas nós cuidamos muito bem dele, então se salvou e está até hoje comigo.
Depois de todas essas coisas ruins que aconteceram, com os nossos animais, eu fiquei me perguntando, sem obter nenhuma resposta: “Por que alguém dá veneno para um cachorro morrer?” É alguém que não tem coração, disso eu tenho certeza. Isso me provou que o ser humano é capaz de fazer tudo, tudo o que quer, tanta maldade, tanta violência...
Sentimo-nos culpados por não ter amarrado todos os cães, para que eles não saíssem. Mas ver eles amarrados é muito triste, todos querem ser livres e os cachorros também, mas há certos cães que vão à casa dos vizinhos e os vizinhos não gostam disso, talvez foi por isso que deram veneno para os meus cachorros, que saíam de vez em quando. Mas nada justifica o que essa pessoa fez com eles. Eles tinham cinco meses, apenas cinco meses, tinham toda a sua vida pela frente, mas não, alguém tem que vir e acabar com tudo.
É muito difícil falar sobre algo de mal que aconteceu com alguma coisa, ou alguém que você gosta. Como para mim, eu gosto muito de cachorros, são meus grandes amigos, mas eu quis escrever sobre eles porque eu queria ver como ficaria esta história no papel. Eu não costumo guardar datas na cabeça, apenas de coisas muito boas ou de coisas muito ruins, e essa foi um acontecimento ruim em minha vida, um acontecimento que eu acredito que eu não vou esquecer e se esquecer, terei estas palavras para lembrar-me. Eu escolhi falar sobre isso porque, também, foi algo bem recente e que foi muito chocante. Você ver o seu cachorro e algumas horas depois vê-lo morto, é muito doloroso. A maioria das pessoas não pensa assim, talvez me achem uma boba, mas para mim é muito importante e marcante.
Mesmo chorando para escrever várias partes do texto, eu escrevi porque eu queria lembrar deles, e parece que, ao escrever, eu me reaproximei dos meus cachorros.
Dedico esta crônica em memória de vocês... 

Bob e Guri.

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