O MEU SEGREDO DOS COSTUMES
Eu tenho um
segredo.
Quer que eu lhe
conte? Mas que pergunta mais besta! É claro que você quer saber o meu segredo,
pois todas as pessoas querem saber os segredos umas das outras. É por este
motivo que o mundo está do jeito que está: todos se metem na vida de todos.
A gente
(inclusive eu) se acostuma a fazer um verdadeiro “interrogatório” aos nossos
amigos, pessoas próximas e até outras pessoas, que ao menos devíamos conhecer
para fazer as perguntas, mas, não conhecemos. Perguntamos coisas como: Qual é o
seu salário? Qual é a sua idade? Quantos filhos você tem? Onde você mora? E uma
porção extragrande de outras perguntas.
Mas se eu lhe
contar o meu segredo você não conta para ninguém?
Sabe o porquê da
pergunta acima? Fiz-lhe essa pergunta porque as pessoas têm a tendência de se
acostumar a ouvir o segredo das outras pessoas e depois sair contando-o para
outras e outras pessoas, e essas outras pessoas contam para umas outras e
outras pessoas, e assim sucessivamente.
Mas vou contá-lo
para você, você é de minha confiança. Mas antes quero esclarecer-lhe algumas
coisas sobre o meu segredo. Uma parte desse segredo não é só em relação a mim.
Como assim? É em relação a todas as pessoas que talvez, tenham a mesma idade
que eu, ou talvez não. Outra parte dele é somente relacionada a mim mesma.
Agora,
finalmente, vou lhe contar o meu segredo. Começarei contando a parte que se
relaciona a mim e, talvez a você também. Depois, partirei para a parte que eu
acho que relaciona-se apenas a mim. Fique tranquilo, eu sei que você terá a
capacidade de distinguir à qual dessas duas partes o que eu lhe contarei
pertence.
Bem, você já
pensou e refletiu sobre as coisas que nos acostumamos a ter, a ver, a sentir, a
falar, a pensar, a fazer, etc., em toda a nossa, de certo modo, curta vida?
Pois é, eu me acostumei a muitas coisas, que não deveria, de jeito nenhum, ter
me acostumado.
Eu me acostumei a
ler livros quando estou deitada na cama. Mas o que tem de mal nesse costume?
Aparentemente nada, mas pensando bem, deitamos na cama para ler um livro, onde,
provavelmente, iremos bocejar e logo dormir com o livro nas mãos. O ruim dessa
história é que nós sabemos disso, mas não tomamos uma atitude para mudar. Se
pretendemos realmente ler, e não dormir, temos que ir para um local claro,
tranquilo e onde possamos sentar, e não deitar.
Eu me acostumei a
sempre planejar o dia de amanhã. Sou, então, uma pessoa muito ansiosa. Quando
deito na cama não consigo dormir por cerca de trinta minutos, porque fico pensando
se fiz tudo o que tinha para fazer no dia todo e o que tenho que fazer no dia
seguinte, e assim perco o tempo a mais que eu poderia dormir, esse costume não
me permite dormir o tempo a mais que eu poderia.
Deixei de fazer
receitas em casa, bolos, doces e salgados, e me acostumei a comprar tudo pronto,
com todos os conservantes que os fabricantes colocam, com todo o preço que
tenho que pagar pelo que compro pronto e com a distância que tenho que me
locomover até a cidade para adquirir os alimentos prontos.
Eu também me acostumei
a dormir até muito tarde nos dias em que não tenho que ir para a escola. Isso
acontece porque tenho (e outras pessoas também têm) de levantar muito cedo
durante os dias que tenho aula (durante a semana). Acabo não podendo ver os
raios do sol bem claros, depois de logo ter nascido e não podendo aproveitar
bem o dia, não vivê-lo do modo que ele deveria ser vivido.
Muitas pessoas,
sendo uma delas eu, se acostumam a gastar muito mais do que poderiam. Mas
gastam, gastam inconscientemente. Quando gastam inconscientemente se acostumam
a fazer prestações, onde podem dividir o valor gasto em mensalidades bem
menores e mais acessíveis do que pagar o valor total do produto em uma só vez,
o chamado “valor a vista”.
Ainda relacionado
ao famoso verbo que nos faz gastar tanto, comprar, eu me acostumei a comprar
coisas que eu nem estava precisando. Você deve estar lhe perguntando por que eu
comprei alguma coisa se eu não estava precisando. Eu respondo para você: Apenas
comprei porque o tal produto estava na promoção, estava mais barato do que
estaria normalmente.
Me acostumei a
quando compro algo novo, logo fazer uso do mesmo. Nem que esse algo seja bem
pequeno, um lápis, uma peça de roupa, um calçado, etc. Eu me acostumei a
estrear logo o novo produto que eu adquiri.
Eu me acostumei a
tirar somente notas boas, notas altas na escola. Mas isso me prejudicou muito,
pois quando tiro uma nota baixa, tenho uma grande decepção comigo mesma, e isso
não é bom e não faz bem. Hoje, me acostumei a tirar notas razoáveis,
suficientes para passar de ano. Então, refaço a minha primeira frase deste
parágrafo: “Eu já me acostumei
a tirar notas boas” pois esse não é o estado atual na minha vida.
Eu me acostumei a
não escrever mais a mão, como eu era obrigada a fazer antes de chegar a máquina
que substituiria essa simples ação: o computador. Com a sua chegada, poucas
pessoas ainda escrevem a mão, tudo agora é digitado e tudo agora é exigido
digitado. Além de ser mais fácil, digitar no computador é mais rápido também. Ele
é uma ótima saída para aqueles que não têm uma letra um tanto legível para que
possa ser compreendida.
Me acostumei a
enquanto a chuva cai, ouvir o seu barulho e assistir um bom filme comendo
pipoca. Mas por que eu não estou tomando um banho na chuva? Será porque eu vou
pegar um resfriado, ficar doente e me molhar, ou será porque eu me acostumei a
fazer outra coisa ao invés disso, que eu ache melhor para mim? Não seria melhor
brincar um pouco na chuva e tomar um banho nela, aproveitar um pouco? São
coisas que nos acostumamos. Pense bem no que você se acostuma, pois os costumes
têm muita influência em nossa vida.
Eu também me
acostumei a aceitar quando alguém não quer, de modo algum, ser meu amigo. Na
maioria das vezes em que isso acontece, eu me pergunto se fiz algo de ruim para
tal pessoa, mas quase sempre chego à conclusão de que não fiz nada e fico sem
saber o motivo de ela não querer ser minha amiga. Gostaria muito que essa
pessoa viesse conversar comigo e me dissesse por que não gosta de mim. Eu
gostaria de ser amiga de todo mundo ou, pelo menos, ser amiga de quem eu
gostaria de ter uma amizade, mas há pouco tempo eu acabei de perceber que isso
nunca será possível, não tenho o poder de fazer alguém gostar de mim e tornar-se meu amigo.
Eu me acostumei a
ser um ser humano. Um ser humano que sente dores, que se machuca, que ama, que
aprecia, que sabe argumentar quando é preciso, que sofre injustiças e que é,
muitas vezes, desprezada. Eu me acostumei a me esforçar e trabalhar para ganhar
o que quero. Enfim, me acostumei a fazer tudo o que um ser humano está
acostumado a fazer.
Eu me acostumei
a, depois de contar o meu segredo para alguém, dizer:
“Agora me conte o seu segredo!”
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